Saindo do forno : La Gaîté Lyrique reabre suas portas em Paris
A história da Gaîté Lyrique é longa e conturbada. Tudo começou em 1759, com a trupe de Jean-Baptiste Nicolet no então chamado Théâtre des danseurs et sauteurs de corde (Teatro dos dançarinos e puladores de corda). Com o passar do tempo, a coisa foi evoluindo, o teatro ganhando público e até mesmo o reconhecimento de Louis XV. Em 1772, o rei autorizou a mudança do nome para Théâtre des Grands Danseurs du Roi (Teatro dos grandes dançarinos do rei).
Desde a inauguração, a Gaîté sempre foi dedicada às obras populares, em todos os sentidos. Em 1873, o célebre Offenbach assume a direção e monta Orphée aux Enfers, consagrando-se com um de seus maiores sucessos e mais de 200 representações. Muitos artistas de renome passaram por seu palco: a bailarina Isadora Duncan em 1909, o baixo-barítono eslavo Fiodor Ivanovitch Chaliapine, os Ballets Russos de Diaghilev entre 1921 e 1925, Luis Mariano em 1945... Até Johnny Halliday esteve por lá, quando ainda era um famoso desconhecido em 1959, mas deixa ele pra lá.
Originalmente, a sala à l'italienne, demolida nos anos 80 para dar lugar a um centro de lazer para crianças, tinha capacidade para 1800 pessoas. Foi uma das maiores perdas da cidade.
O edifício, construído entre 1862 e 1864 em estilo Renascença italiana, é de autoria de Alphonse Cuzin. A fachada é composta por 5 arcadas no térreo, formando o soubassement. Ele é sobreposto por outras 5 arcadas que formam a ordem jônica colossal, compondo a loggia do primeiro andar que acolhe o foyer. Em suas extremidadades, encontram-se duas esculturas : a primeira, situada à esquerda é obra de Amédée Donatien Doublemand e leva os traços de Scapin, personagem da comédia de mesmo nome de Molière. A segunda, à direita, representa o drama personificado por Hamlet, e é obra de Eugène Louis Godin. Os maiores nomes do teatro de até então são homenageados com medalhões pintados no foyer : Shakespeara, Molière, Racine, Beaumarchais e Schiller.
Infelizmente, incêndios, reformas urbanísticas do barão de Haussmann, abandonos, reaberturas e rehabilitações catastróficas fizeram parte dos inúmeros dramas protagonizados pelo edifício.
Orphée aux enfers - Cliché Bibliothèque Nationale de France |
O que sobrou do Théâtre de la Gaîté Lyrique acaba de reabrir novamente suas portas. O pretencioso empreendimento da Mairie de Paris, será dedicado às culturas digitais e músicas atuais. Um local inédito na cidade de exploração da arte, música, performances, design, moda e cinema. Tudo isso com uma boa dose de interatividade. Além de exposições, idéia é promover pelo menos 3 shows por semana, 120 performances e spectacles vivants por ano.
O projeto é de Manuelle Gautrand, arquiteta francesa nascida em 1961 e autora do famosíssimo projeto da Citroën na Av. des Champs Elysées.
Consta no programa :
- 2 sala de espetáculos. A principal com capacidade para 750 pessoas em pé e 300 sentadas e a menor com capacidade para 100 pessoas ;
- Auditório para 130 pessoas ;
- Salas de exposições temporárias ;
- Studios de criação e produção ;
- Centro de documentação ;
- 2 cafés ;
- Loja.
Imagem : Manuelle Gautrand |
Imagem : Manuelle Gautrand |
Imagem : Manuelle Gautrand |
Repare que as duas imagens acima mostram tratamentos diferentes dados ao foyer histórico.
A primeira é uma montagem digital, que deveria fazer parte do projeto do concurso. Nela, o tratamento do piso é mais audacioso, criando um espaço interativo. O provável acabamento original das paredes laterais, dotadas de lareiras esculpidas em mármore branco, era substituído por superfícies espelhadas, criando uma ilusão de profundidade infinita.
Felizmente, essas intervenções não devem ter passado pela inspeção dos monumentos históricos de Paris, já que o edifício é inscrito desde 1984 no Inventário (de Monumentos Históricos da França). Assim, os tratamentos mais contemporânes foram concentrados na parte contemporânea, posterior do edifício.
Como mostra a foto do projeto executado, o provável piso em parquet de origem foi mantido com algumas instalações isoladas, e na minha opinião mais adequadas, que me fazem pensar em pixels. Seriam referências às culturas digitais ?! Hehe. Também dá pra ver as paredes patinadas (acredito eu) em mármore avermelhado.
A parte inferior das colunas, verde na primeira imagem, apresenta um colorido alaranjado na foto. As sondagens de superfície (estratigrafia cromática) teriam revelado a cor original ? Infelizmente os princípios da restauração francesa raramente deixam aparecer os testemunhos das restaurações executadas com o passar do tempo...
Mas...Como tudo que é evento que se preze em Paris tem o seu catálogo publicado, vou ficar aguardando ansiosamente !
[Cá entre nós : Qualquer pessoa que tenha feito seu projeto final de graduação em um edifício histórico sabe que os espaços de ação não devem jamais competir com os espaços de contemplação ! Hehehe...]
2004-2011 : Manuelle Gautrand « Le réveil d'un bâtiment » from La Gaîté Lyrique on Vimeo.
O despertar de um edifício - por Manuelle Gautrand, autora do projeto.
Filme em francês legendado em inglês.
Ouverture de la Gaîté Lyrique
Inauguração da Gaîté Lyrique - 2 de março de 2011
Filme em francês sem legendas.
Maiores informações :
Mairie de Paris
Site histórico da Gaîté Lyrique - por Astrid de Savignac e Hélène Crampon
Gaîté Lyrique
Manuelle Gautrand
2 comentários:
Muito bacana este post. Boa pesquisa em bom e muito interessante post.
Luiz Felipe
Aquele render com projecoes no chao está muito estranho, parece um carnaval (pra aproveitar a época...)!
Mas eu também sou assumidamente anti-3Ds - depois do post do Rio2016 nao dá mais pra disfacar...
Agora aqueles grupinhos de cubos iluminados ficaram muito legais contrastando com a sala super decorada. Eles tem alguma funcao?
E mais, teremos em breve fotos exclusivas, nao? ;)
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